Textos

S/A Do Pânico (Versos Ditirâmbicos)
“Meu amor me ensinou a ser simples/
como um largo de igreja/
onde não há nem um sino/
nem um lápis/nenhuma sensualidade.”
(Oswald de Andrade)

Uma alegria fugaz para usar todo dia
Sem mistérios, sem tempo perdido para buscar
Outra maneira de ficar atento
Depois, a prateleira do supermercado
Fazer a feira na festa do ap.
Pode ter certeza não vai faltar brilho
Nem conversas sobre a pátria das chuteiras
Birita ou bundalelê
Nem tampouco papel higiênico
Não haverá mais tédio
Depois da epidemia do carnaval
Você terá mudado pouco
Melhorado o seu talento
Valeu em parte ter limpado
Na falta de toalhas de papel
A mesa do rango com papel higiênico
Deixa sangrar sua tpm
Deixe estar. Estar na eme
Fale um pouco desse seu discurso brega
Da engrenagem mental da armadilha
Como se amar fosse se refugiar
Numa viagem cega numa ilha
Produza algo de inusitado
Um “insight” nesse arquipélago de nãos
Ligue seu Pentium Quatro
Espante a fera da solidão
Ponha a água do chá no fogo
Invista no molho do feijão
Beba um cale-se de vinho faça um espaguete
Invista na cultura do forno e do fogão
Navegue no Titanic Internet
Como último recurso de fugir
Da fera da solidão
Ah ! Aquele sentimento oceânico
Há seu semblante lúdico e musical
Com trilha sonora de neon branco
Você com aquele sapatão de salto grosso
Assumindo seus ares de bacana, manca
Caminhando pelo calçadão de carne
Em oferta nos bares da av. Compracabana
Você só quer uma noite de cama
Depois de encarar uma trilha de arsênico
Roçar seu umbigo no meu braço
Seu quadril: o signo do signo da Balança
Olhos de ressaca, Capitu e Madona
Nada de mal nos alcança
Você, seu jeito de fragmento fotogênico
Na falta de guardanapos de papel
Só, só precisas de um
pedaço de papel higiênico
Café da manhã, merenda, lanche, almoço
Acho o máximo essa cara de anjo torto, insone
Cantada no atalho das músicas
Desfrutada pelas sete vidas
Do canil cafona dos Rolling Stones
Ah, esse seu espaço cênico
Onde você morre de preguiça
Macunaíma circula em seu sangue ancestral
Sua distração, seu lanche, o arroz tropeiro
Sua atenção plugada nesse espaço cênico
Na cidade de carne de seu corpo
O corcel do desejo cavalga pênsil
Nada nos há de faltar
Nada de mal nos alcança
Sagrado pedaço de papel higiênico
O banho ao levantar
Esqueci de lhe ajudar
A passar o sabonete no pentelho
Exato no triângulo de cabelos
Pintados de ouro e de branco
No alto límbico dos grandes lábios
Limpo no canto de sua boca
Aquele mel azedo que pinga de seu queixo santo
Um pedaço de baba esquizofrênico
Eu faço sua foto desenhada
Desse buquê surreal de sardas, faço poesia
Para você, minha musa de papel higiênico
Não posso dizer que no escuro
Vi em você aquela lágrima que não se vê
Ou você me chama, me chama
Ou a rotina pega você pelo pé
Seu calcanhar de Aquiles tingido, helênico
Com o sangue menstrual da mulher
Suas contas a pagar, suas rotinas helênicas
Sua televisão ligada na história
Na Ilíada do papel higiênico
Suas idéias avançaram
Você teve uma única na vida ?
Sua entropia está em curso
Você desfilou vestida de pele de raposa, de foca
Ou na pele do príncipe urso ?
Seus sonhos encantados
há muito estão de cócoras
Seus passos caminhando na chuva
Sua sala de jantar quântica
Seus filhos enlatados
Sua casa na praia em Ubachuva
Você nem ousa pensar em voar como a Fênix
Você está mais pesada que a Wilsa Carla
Desfilando na praia do Coqueiro
Você se dirige firme ao banheiro
Toda segura de si
A segurar o pedaço de papel higiênico
O novo dia chegou
O novo que você teme
O samba que você não dança
A dança que você não sente
Seus filhos, educados pelo controle remoto
Por uma notícia súbita, um pé de vento
As idéias e a cultura, passem bem
Tudo se limpa bem demais
Os restos mortais do rancho de ontem
Basta um pedaço de papel higiênico
A tv higienizou seus hábitos
O hábito faz o monge?
Não se afobe, nem entre em pânico
Sua síndrome você limpa de perto, de longe
Purifica a cara com pó de arroz
Com o batom das mulheres de Atenas
Uma vez dentro do banheiro
Com certeza não vai faltar
Em todos os esportes olímpicos
O sucesso mais espetacular
O corre-corre atrás do dinheiro
O recorde do atleta cínico
Dirigindo-se apressado ao banheiro
Em busca da salvação
Num pedaço de papel higiênico
Que bom que houve a maçã
No paraíso perdido da Grécia
E que as medalhas de ouro
Dos atletas que riem no fim
Todos tinham algo por que lutar
Nem que seja pensando assim
Um desafio a visualizar
Eles têm medo de que o suor e todo esse cansaço
Não seja afinal suficiente
E o Titanic de seus esforços
Redundem numa beleza incoerente
Quando a noite vier e restar apenas
Um pedaço de sanidade
Preso ao papel higiênico
Por favor, não higienize meus hábitos
Mantenha sempre no lugar sua lira e o seu arco
Aonde você se esconde?
Entre os sais e as panelas do quarto ?
Que algo mais se preserve de você
Que não seja apenas os ésteres
Das estrias de seus bibelôs
E da arte de engolir sapos
Que uma mágica qualquer te preserve
De renovar essa sua disposição
Para ser companheira íntima dos ácaros
Você leu um livro este ano ?
Depois da Micarina tudo voltou ao norma l?
A sala de jantar, o deserto dos tártaros
Você embargou noutro par ?
Num outro desejo autêntico
Entrou no carro foi ao trabalho, foi estudar ?
Escondeu-se do sol esperançosa e feliz ?
Como uma atriz de Celebridades Belíssimas
Com hora marcada no celular
Da sensualidade da cidade de carne
Verde-amarela, como uma flor medrosa, arisca
Na lipoaspiração do papel higiênico
Com esse seu sorriso de pagode
Artificial e mecânico como
Uma entrevista de jogador de futebol
De misse Brasil 2006
Você sacode a poeira da folia
E embarca como um peixe
De boca no próximo anzol
Na grana do próximo freguês
E o mundo existe como se fosse para você
Seu coração, um bloco de gelo autêntico
Pulsa. Seu pulso ainda pulsa
E sua mão segura esperançosa, automatizada
Um pedaço da cidade em seu apartamento
Um naco globalizado
Comprado no supermercado
De seu papel higiênico
DECIO GOODNEWS
Enviado por DECIO GOODNEWS em 03/04/2010


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